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A Hora da Estrela (trecho)

Por que escrevo? Antes de tudo porque captei o espírito da língua e assim às vezes a forma é que faz conteúdo. Escrevo portanto não por causa da nordestina mas por motivo grave de "força maior", como se diz nos requerimentos oficiais, por "força de lei". Sim, minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias
soltas, pois eu também sou ó escuro da noite.
Embora não agüente bem ouvir um assovio no escuro, e passos. Escuridão? lembro-me de uma namorada: era moça-mulher e que escuridão dentro de seu corpo. Nunca a esqueci: jamais se esquece a pessoa com quem se dormiu. O acontecimento fica tatuado em marca de fogo
na carne viva e todos os que percebem o estigma fogem com horror.
[...]
E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela. Bem, é verdade que também queria alcançar uma sensação fina e que esse finíssimo não se quebrasse em linha perpétua. Ao mesmo tempo que quero também alcançar o trombone mais grosso e baixo, grave e terra, tão a troco de nada que por nervosismo de escrever eu tivesse um acesso incontrolável de riso vindo do peito. E quero aceitar minha liberdade sem pensar o que muitos acham: que existir é coisa de doido, caso de loucura. Porque parece. Existir não é lógico.

Comentários

Lele disse…
"Sim, minha força está na solidão.
Não tenho medo de chuvas tempestivas,
nem das grandes ventanias soltas,
pois eu também sou o escuro da noite."
"Sou como você me vê,
posso ser leve como uma brisa
ou forte como uma ventania,
depende de quando e como você me vê passar."
Clarice Lispector
AMO AMO AMOOOOO¹²³
Anônimo disse…
a conhecia so de nome,ate ontem quando li uma frase sua que me fez sentir um conforto.nao li livros dela ainda mas vou correr para procurar um porque as frases dela sao bem profundas parece ter um publico chave. e talvez me ajude.ou me conforte.
Aquiles disse…
Amo também e digo mais, amo também você, pode ser que por pouco tempo, pode ser para sempre, sei lá. Agora basta isso o que virá pouco interessa.
Anônimo disse…
Olha, nao ler a Clarice Lispector e não se enxergar é humanamente impossível. E ela não escreve nada que seja lugar comum. Pelo contrário. Vai lá naquele espaço seu ainda não preenchido, que vc jamais se deu conta que existia, com apenas duas ou três frases. Como não se apaixonar?
Anônimo disse…
Clarice encarnou Shakespeare nessa obra_ a ver pelo trecho que narra a famosa frase "eu também sou o escuro da noite". O problema parece muito menor e pouco ofensivo, tão logo nos sentimos parte integrante dele.

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